segunda-feira, 13 de setembro de 2010

A Segunda Captura... Artigo de: Ivan Almeida.

Considerações... Encontrei este artigo na Internet, e achei muito interresante compartilhar com todos!
Pachelly J.


Planejamento e Resultados

Postar uma fotografia em um site de partilhamento de fotografias e de críticas implica em assumi-la como componente de nossa obra. A escolha das fotos postadas constitui um segundo ato fotográfico, uma Segunda Captura. A escolha é um processo incluindo desenvolver a fotografia para evidenciar as idéias nela contidas, e é preciso ter clareza sobre quais sejam.

Esse processo de escolha no qual uma fotografia é pinçada entre as outras, ele nem sempre é completamente consciente, e muitas vezes a partir dos comentários nos sites de fotografia, somos obrigados a compreender nossa própria produção, especialmente quando, por algum viés dos comentários, está embutida a pergunta: “Por quê? Porque você mostrou esta foto?”

Essa pergunta me foi feita, e para responder voltei-me para a fotografia tentando identificar aquilo nela atraente aos meus olhos. Procurei compreender o meu olhar, sobretudo.

1)A feitura da foto – o meta-projeto.
Na frente da minha casa acontece anualmente um festival de cultura japonesa. É quase impossível ignorá-lo, pois o vejo da janela, então, ir fotografá-lo é irresistível.
De noite, e usando baixas velocidades, evidentemente não podia querer congelar completamente movimentos rápidos e vigorosos dos percussionistas de Taiko. Então, o meta-projeto das fotografias incluía o borramento. A escolha da 135mm, por sua vez, impõe o corte do contexto. Não era possível o isolamento perfeito de um percussionista nem a inclusão completa do contexto, obrigando uma abordagem onde o recorte do frame seria elemento da composição.

De onde venho, da arquitetura, esse núcleo de propostas tem um nome: “partido”. O partido de um projeto é uma série de orientações projetuais não integrantes do rol de necessidades, mas que o arquiteto julga serem contribuições capazes de caracterizá-lo.

Por exemplo, o Frank Lloyd Write, não precisava construir sobre a cascata, mas percebeu o potencial da construção assim feita. Construir sobre a cascata não é parte do programa de uma casa, mas a casa sobre a cascata é única exatamente pelo partido do arquiteto.

No caso da fotografia, traduzir o borrado não era obrigatório. Sempre seria possível usar uma lente mais curta e mais luminosa, elevar o ISO, e os movimentos ficariam mais detidos. A escolha de deixar borrar faz parte do partido, não é injunção dos meios.

Fiz 22 fotografias, divididas quatro ou cinco tipos.

2) A segunda captura – o reconhecimento.
No Taiko os percussionistas fazem movimentos amplos e sincronizados. Isso gerou um padrão formal repetitivo. Embora tal coisa fizesse parte do meta-projeto e fosse buscada na captura, a pregnância desse padrão resultou uma surpresa feliz, com uma potência agradável e algo inesperada.

Figura 2
Observando as várias fotos, essa escolhida foi onde houve maior coerência de movimentos, produzindo composição de força formal pela repetição de quase-paralelas, cuja angulação nas duas direções é aproximadamente a mesma.

A primeira coisa notável é a existência dessas paralelas formadas por linhas continuadas entre um braço e uma baqueta, uma perna e outro braço, etc. Várias linhas são continuadas entre elementos. Isso é pregnante a ponto de constituir um dos temas da foto. Dentre várias fotos, essa apresentou esse padrão mais perfeitamente, mais claro, inequívoco.

Tal coisa foi planejada?
Até certo ponto sim, estava contida no partido, mas em fotos feitas com tal dinâmica temos apenas uma probabilidade de sucesso. Fazemos certo número de fotos contando com essa probabilidade. Há planejamento probabilístico, mas há igualmente acaso.

Já o enquadramento fechado nos coloca dentro da ação, apesar do distanciamento normalmente produzido por uma tele. Também é uma escolha de enquadramento, e também é uma escolha probabilística, não uma certeza nem um planejamento exato.

3)Enquadramento planejado e bônus.

A partir da plataforma probabilística acima exposta, há eventos imprevisíveis. Na figura 3 vemos a razão de nosso olhar sempre terminar na percussionista de cima. O olhar é levado a um vértice superior de um triângulo formado pelas inclinadas.

Figura 3
Notar isso e escolher a foto é uma ação de segunda captura, de reconhecimento de um fenômeno perceptivo em uma fotografia. Um fenômeno inesperado, um fenômeno impossível de prever na primeira captura, mas completamente dominável na segunda. Nesta foto o olhar vai incessantemente a essa percussionista.

Outro bônus ainda é relativo a esta percussionista. Ela é a única figura humana a olhar para a esquerda. Todos os outros olham para a direita. Produz-se uma perturbação, eu mesmo me sinto perturbado por isso, pois ela, única, é o atrator do olhar por força do triângulo, e assim ganha um peso enorme e impõe uma inversão interpretativa desproporcional ao seu tamanho no quadro.
Por que esta fotografia?

Ao tentarmos responder a essa pergunta, responder porque esta fotografia entre outras foi escolhida como obra e as outras não, podemos lançar luz sobre nossos processos criativos, podemos mapeá-los e podemos compreender o que em uma fotografia é interessante para nós, especialmente quando a fotografia em si não parece conter nada definido, como neste caso aqui comentado.

Muitos confundem essa busca de compreensão, busca externada através de textos como esse, como uma tentativa de validar imagens através de palavras. Não é isso. Os méritos e deméritos de cada fotografia são imutáveis, os dessa igualmente, mas independentemente deles podemos compreender em cada foto os nossos processos de criação. E podemos falar sobre os processos de criação, assim retirando coisa tão importante do território da vagueza, do acaso mágico, da inspiração, trazendo-os para o entendimento, tanto quanto possam ser entendidos. Podemos lançar luz sobre o jogo que acontece entre nossas intenções e os resultados, jogo esse que é mistura de planejamento e de aproveitamento.

Autor: Ivan Almeida.

5 comentários:

Dihelson Mendonça disse...

Na minha pouca experiência como fotógrafo, eu pude comprovar uma coisa que eu já suspeitava em outras áreas do conhecimento:

Que o universo se rege por leis de movimentos cíclicos. Às vezes acertamos sem querer mesmo, porque o universo se deixa fotografar, e o fotógrafo pensa que foi ele, quando na verdade, este apenas registrou uma coisa natural.

Eu faço muita foto "acidental" que na hora, não acho que valeu a pena, mas quando vou ver na tela grande, vejo sincronismos impressionantes que o olho fotográfico viu, mas a mente não percebeu.

Por isso, se eu tivesse que dar um só conselho a alguém sobre como fazer uma boa foto, eu diria:

Faça muitas fotos. Um dia você vai entrar em sincronia com o universo, e revelar coisas incríveis. Afinal, não se pode errar sempre, mesmo nas leis das probabilidades.

É como eu disse noutro comentário: parece até que o universo ajuda o fotógrafo. Na verdade, é apenas uma ilusão de ótica.

Abraços,

Dihelson Mendonça

Dihelson Mendonça disse...

O fotógrafo só precisa estar atento a esses ciclos, e deixar-se envolver pela cena, prevendo as coisas antes de acontecer. Antecipar-se aos movimentos, de forma absolutamente natural.

DM

Pachelly Jamacaru disse...

O que levou a publicar esta artigo, foi exatamente o exercício de aprendizagem que vem o prório ato de fotografar e, o recondicinamento do olhar, apos o ato em si!

Não que o fotógrafo espere pelas casualidades, mas que não as desperdiçem. A fotografia consciente, ainda é a grande virtude! E rever o material escolhido, causas muitas surpresas agradáveis e não precebidas a primeira vista!

Conseho de sá sim, e este, o de fazer vários disparos em torno do assunto, é muito válido, principalmente se estamos com a tecnologia a nosso favor, não podemos nos dar ao luxo de deixar passar um momneto único, e nos achar-mos infalíveis e excepcionais, até porque ninguém é, a ponto de querer resolver todas as oportunidades de uma bela foto, num único disparo!

Então taí, cada um com seus métodos e que também advem da contribuição dos sábios, que um dia ralaram muito para ter mais autonomia e saberem fazer escolhas decisivas na hora H ou depois desta.

Abração

Dihelson Mendonça disse...

Entendamos uma coisa, para que não paire mal-entendidos:

o comentário que fiz é exatamente EM ACORDO com o artigo, que por sinal, é excelente.

Abraços,

DM

Pachelly Jamacaru disse...

Não nenhum mal entendido Dihelson, estou até reforçando o seu comentário, se observar bem!

Estou de acordo numa abordadegem ampla em torno do assunto, e examina-lo com calma, e extrair mais do que o que apenas se viu no momento!

Bom, se nao consegui transmitir corretamente!!!